domingo, 2 de julho de 2017

O INFERNO DE GABRIEL E A PAIXÃO POR BEATRIZ

Foi o mais avassalador sentimento de um homem por uma mulher; embora não pudessem viver a paixão que os consumia pois, um e outro, haveriam de casar por imposições familiares, restava a paixão e o platonismo que desencadeava os mais belos poemas para Beatriz, como o Canto dos Cisnes:

"Tão longamente me reteve Amor
E acostumou-se à sua tirania,
Que, se a princípio parecia rude,
Suave agora me habita o coração.
Assim, quando me tira tanto as forças
Que os espíritos vejo me fugirem,
Então a minha frágil alma sinto
Tão doce, que o meu rosto empalidece,
Pois Amor tem em mim tanto poder
Que faz os meus suspiros me deixarem
E saírem chamando
A minha amada, para dar-me alento.
Onde quer que eu a veja, tal sucede,
E é coisa tão humil que não se crê."

Beatriz, mulher de outro, um dos maiores adultérios espirituais da história da literatura, é personagem viva em toda poesia de Dante:

"Pelo exemplo de Beatriz compreende-se 
facilmente como o amor feminino dura pouco, 
se não for conservado aceso pelo olhar e pelo tacto do homem amado."

Aníbal de La Vharga, em 1953, deu sua versão:

"- Diga-me, Beatriz, você nunca sonha comigo?...

Agitado pela carreira, aberto o gibão, o rosto aceso e os gestos um tantos entorpecidos, apresenta o jovem um aspecto diferente, que intimida a moça. As amigas, julgando-o ébrio, aconselham-na a retirar-se.

- Vamos querida Bice, deixe-o.

- Não, não vá! Responda-me - insiste Dante, aproximando-se ainda mais. Beatriz retrocede e se afasta rapidamente.

- Sempre é assim! Nos sonhos também não consigo alcança-la. Tem a pele demasiadamente branca.

Logo após este encontro, suas diversões têm o caráter de orgias. Dante beija todas as bocas formosas que encontra, rima odes, bebe e chama de Beatriz a todas as mulheres.

- Num homem existe o anjo e o demônio - explica ele a um companheiro. Mas eu possuo uma característica especial: tenho o anjo separado do demônio. O anjo se chama Beatriz, o diabo sou eu. Os dois juntos somos um."

Dante Alighieri nasceu em Florença, no ano de 1265; era o período medieval e reinava São Luís IX na França. São Tomás de Aquino e São Boaventura ainda viviam, haviam cruzadas e se construíam as grandes catedrais. Dante faleceu no ano de 1321 no dia 14 de setembro.

Beatriz Portinari, ou Beatrice (Bice) Portinari em italiano, nasceu em 1266 e faleceu no dia 8 de junho de 1290; foi a musa e a paixão de Dante.

Toda a paixão de Dante por Beatriz deu, também, origem ao romance de Sylvain Reynard (pseudônimo de autor desconhecido) "O Inferno de Gabriel", onde um professor universitário apaixona-se por sua aluna e amiga da família e a transforma na sua Beatriz. 

Envolvente, mas também cansativo, o romance personifica a Beatriz de Dante na figura de Juliane, a Beatriz de Gabriel:

"O calor irradiava de seus braços nus e de sua blusa, aquecendo-a.
Ela respirou fundo e em seguida suspirou, contente e impressionada ao notar como se encaixava bem debaixo do braço dele. Como se tivesse sido feita para ele.
- Você é Beatriz.
- Beatriz?
- Beatriz, de Dante.
- Ela ficou vermelha.
- Não sei quem é.
Gabriel deu uma risadinha, seu hálito quente contra o rosto dela enquanto esfregava o nariz em sua orelha.
- Eles não lhe contaram? Não disseram que o filho pródigo está escrevendo um livro sobre Dante e Beatriz?
Quando Julia não respondeu, ele levou os lábios até o topo de sua cabeça e pousou um beijo suave em seu cabelos."

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