domingo, 22 de maio de 2016

O PENSAMENTO A SERVIÇO DO CORAÇÃO

Todo o ser humano, em qualquer parte do mundo, em um momento de sua vida deixa-se levar pelos pensamentos; estejamos onde estivermos. Divinópolis, Recife, Porto Velho ou Santana do Livramento no Brasil; Elizabeth, Palo Alto ou Montain View nos Estados Unidos; Damaia ou Figueira da Fóz em Portugal; ou em algum canto qualquer que somente o Satéllite Provider poderá localizar, não temos saída, o pensamento estará sempre nos impondo conceitos; lembranças, boas ou más; arrependimentos; saudades; sonhos, feitos, desfeitos ou por se fazer. Uma ditadura imposta a qualquer hora à todo àquele que não souber controlá-lo.
É pois, nosso pensamento, o sensor implacável de todos os momentos da nossa vida. Não podemos nos livrar do pensamento; pensamos a todo instante e isso é inerente ao ser humano. Entretanto, podemos controlar o pensamento; podemos direcioná-lo; podemos fazê-lo "trabalhar" em nosso proveito; talvez seja por isso que Osho escreveu certa vez que "a cabeça é um bom instrumento, mas tem de ser usada como um servo - ela não deve ser o mestre".
Parece, nessa visão de Osho, que o pensamento é meramente pragmático, fazendo uma distinção entre o pensar e o amar. Nesse caso, segundo àquele pensador, o ato de amar não é uma ação do pensamento e sim ação do coração, dando à este uma autonomia tal que independe do cérebro para acontecer. "Uma pessoa muito obcecada com o pensamento em pouco tempo se esquece completamente de que também tem um coração", diz Osho, e completa: "há milhões de pessoas neste estado, sem saber o que significa o coração".
Essa postura do mais polêmico pensador do mundo contemporâneo transforma o coração não só na máquina que faz pulsar a vida, bombeando a energia vital pelo corpo humano, mas o coloca como o centro da sensibilidade; é o coração responsável pelo amor, seja àquele direcionado às questões pessoais ou àquele no nível metafísico, e faz uma crítica ao pragmatismo daqueles que se deixam levar unicamente pelo pensamento: "uma vez que a cabeça se torne o mestre e o coração seja deixado para trás, você viverá, você morrerá, mas você não saberá o que é Deus, porque não saberá o que é amor".
Para Osho o silêncio é fundamental, pois nos coloca como sujeito em relação ao pensamento e, dessa forma, poderemos controla-lo. A meditação é o caminho. Para meditar esqueça o pensamento, deixe-o fluir sem dar-lhe importância e concentre-se unicamente no silêncio, no vazio, no nada. Imagine-se numa "tábula rasa" e a partir daí seja meramente um espectador.
Parece difícil, mas é bem provável que todo àquele que começar a fazer essa distinção, entre o cérebro e o coração, transformará o pensamento no mais perfeito instrumento para servir-lhe.
Podemos começar com um conselho do próprio Osho: "Então, silencie e observe".

sexta-feira, 20 de maio de 2016

ATÉ QUANDO?

Deparei-me hoje com uma cena já normal nas grandes capitais: A sarjeta e o caos onde habitam humanos sem rumo, sem norte, à margem do que se convencionou chamar de sociedade; vítimas de si mesmo; entregues à ruína da exaustão existencial; presos à ilusão de drogas e à necessidade da compaixão do outro. À beira do abismo!

Fiquei a pensar...

O que leva o indivíduo a desgostar de si; a entregar-se ao nada; a debruçar-se sobre a lama e a imundície desse lodo desumano que lhes esfacela o corpo, inutiliza sua alma e o desliga do seu próprio Ser, desalojando-o do seu espírito?

Por que essa alienação da vida; o corte do ínfimo fio que o ligaria a uma história comum de todos os humanos; à opção insana pelo mais profundo e escuro oceano do vazio existencial?

Se nem mesmo esses humanos que vagam pela escuridão da vida se revelam a si, certamente que mudos estarão a qualquer desses questionamentos.

Mas a existência não é muda; a filosofia não é muda; a razão não é muda; a reflexão não é muda; o mundo não é mudo e a sociedade não deveria ser muda, embora se cale!

Não há desculpa para o culpado e o júri um dia aplicará uma sentença, pois a Lei deve ser cumprida, aqui e acolá.

E qual a Lei que irá punir àquele, àquela, e todos os culpados pelos zumbis que se acotovelam, se esbarram entre si e entre outros, na escuridão de uma existência insana que lhes foi imposta por um determinismo que não escolheu?

Quando nos deparamos com a miséria insana de corpos que se vendem, que se alugam e que se dão, uns aos outros, na podridão da alienação por fraqueza, ou por insanidade, escondendo-se numa tragada de crack ou qualquer outra ilusão que lhes satisfaça o nada existencial, perguntamos se não haverá dentre todos nós responsáveis pelo caos que se instalou numa sociedade que se quer humana?

A cada passo dado, um aqui e outro acolá, as vidas se instalam em ventres diversos e o mundo é alimentado segundo a segundo com seres humanos que ao acaso habitam e desabitam um plano existencial. Os olhos da sociedade ficam cegos a esse vai-e-vem e na imensidão do tempo, que nos contempla, transitamos pela existência como se dela e nela somente o acaso fosse a razão. Não nos perguntamos por que um ventre viciado, alienado e jogado na sarjeta das drogas e do mundo é habitado por outro Ser que o mesmo caminho seguirá. Somos solidários com a miséria humana e ainda temos desculpas religiosas para o submundo social que à margem, e marginalizado, sustenta o “status quo” dessa “divina comédia”.

É de se perguntar: Por que e para que filhos do submundo?

Para que espíritos aqui venham cumprir sua missão; mesmo que seja a de viver como zumbis?

Não mais me serve essa teologia da necessidade espiritual; o que está a me parecer como desculpa para excluir-se da responsabilidade de um mundo insano.

É por isso que fica dificílimo ser um existencialista e ao mesmo tempo um Cristão. É preciso ter muita fé para ser existencialista e olhar profundamente para esse mundo que aí está, e que nele estamos, e apenas contempla-lo, deixando seguir seu curso como se nada fosse de nossa responsabilidade, a não ser, eximir-se da culpa.

Vamos ao processo de alteridade: Eu não queria ser como esse outro, mas colocando-me no lugar desse outro, vejo-me inerte para gritar por socorro, embora esteja com a mão estendida para que me tirem dessa lama.

Até quando?

terça-feira, 17 de maio de 2016

O INFINITO DO ARTISTA

Seria tautológico dizer que a obra de arte é aberta pois ela o é. O artista quando inicia o processo de criação está envolto em sua objetividade e em sua subjetividade; seu cotidiano não difere do cotidiano que cerca todos os humanos que habitam uma sociedade, e nesse processo de criação está envolto e com ele se confunde. Entretanto, como artista, no processo de criação sua subjetividade aflora independente da sua vontade objetiva. Nessa simbiose a veia artística se desenvolve externando objetividade e subjetividade e se consubstanciando no coração da obra: a sua essência e que, na duração do fazer e se fazer, culminará na sua existência.

O processo de criação exige do artista, de forma inconsciente, àquilo que lhe é próprio: a sensibilidade. É pela sensibilidade que se processa todo o arcabouço de uma obra e é pela sensibilidade que o artista a tem pronta antes mesmo de externar um só pingo de tinta em uma tela, um só pingo de caneta no papel, um só dedilhado no teclado do piano. A obra, assim, existe sem existir; vive sem ainda ter nascido. Aqui, exatamente aqui, ela tem um "dono" que lhe possibilitará o sopro da existência; ela, a obra, vive no artista, lhe é intrínseca, faz parte da sua alma. Ela é o sangue de vida do útero materno; o sêmen não processado pelo acasalamento, mas que vive em potência; pela potência de Ser.

Arduamente o artista transforma a potência em Ser, ao estabelecer o liame entre a sensibilidade e o processo de criação. Assim o artista e a obra, se fazem; uma obra tem na sua essência a sensibilidade do artista e, ao mesmo tempo, é o artista. Contém na sua composição pragmática toda essência potencializada na criação que se fez e foi feita. Enquanto o artista faz a obra a obra se faz com o artista. Esse caminho de mãos dadas, onde misturam-se emoções, pensamentos, realidade e irrealidade; sensibilidade, manifestações inconscientes faz da obra em formação sempre inacabada; sendo criada ao mesmo tempo que se cria. O artista cria a obra e a obra se cria com o artista. Uma obra de arte em criação nunca é, nem mesmo um esboço; a primeira pincelada, a primeira tentativa de aformoseamento aflora-se pela sensibilidade artística uma parceria entre aquilo que é pensado ou projetado e aquilo que vai se processando na criação.

Assim pois, a obra de arte nunca é; ela está sempre em formação pois a sua estrutura pragmática, a sua existência, será sempre aberta e a cada olhar se manifestará em processo, estando sempre em constante superação daquilo que é para aquilo que tem potência de Ser.

Exatamente nessa constante superação alia-se ao artista e à obra o seu objetivo: deixar-se ver; mostrar-se; encantar e desencantar. Questionar e despertar sonhos ou verdades. A obra é pois livre e aqui perde a paternidade e se coloca aberta a interpretações. Ela é, por si só, uma infinidade de possibilidades interpretativas e satisfaz a cada uma dessas interpretações por estar aberta justamente à todas essas interpretações. A obra não é mais do artista, não tem mais "dono"; rompeu-se o ínfimo fio de ligação entre o criador e sua criação. Nem mesmo a própria obra é mais dona de si pois sua extensão é infinita.

Assim pois, vê-se na obra de arte o sonho, a realidade, a quimera, a verdade, a ilusão, a vida e a alma; a música e a poesia. Nessa dança em que o autor e a obra embalam àqueles que se misturam com seus olhares e com suas almas processa-se o ápice da escalada ao infinito do artista.

A FORÇA EXPRESSIVA DE UMA OBRA DE ARTE

Ghost, Obra em Óleo, tela 86x63, emoldurada em quadro de madeira especial, criação do Artista Vanderlei Assis, é uma dessas exceções em que a objetividade se apresenta tão forte que a interpretação das almas mais suscetíveis a verdade expressada chegam a chocar-se. Nela o artista sobrevoou o mundo do alto da sua alma criativa e apontou, pincelada a pincelada, o caminho existencial de toda criatura. Com tons fortes expressando a natureza e brandamente, aqui e acolá, possibilitando um pequeno vazio para a fuga da realidade, onde àqueles que são tocados podem respirar e recompor-se de uma verdade inalienável, dura e única, impossível de fuga ou de postergação.

A verdade expressada por Vanderlei Assis tornou sua Obra, apresentada no Vernissage do Salão Verde da Câmara dos Deputados, em debates acalorados sobre a existência humana e os caminhos desconhecidos depois da transição entre o Ser e o Não-ser. Um misto de tentativas e elucubrações filosófico-teológicas se desenvolveram durante os dias da exposição e, quizá, durante as noites em que àqueles que lá estiveram deixaram seus pensamentos conduzirem-nos aos devaneios de uma realidade impossível de se desfazer ou de se mudar.

O quadro é atípico pois foi rejeitado pela filha do artista que viu, naquela obra, a retratação de uma caminhada existencial associada a seus pais. Claro uma interpretação também atípica pois envolveu a passionalidade, compreensível pela ligação emocional.

Foi por essa atipicidade que o quadro envolveu tantas outras pessoas, entre debates acalorados e as tentativas de estabelecerem-se primazias filosóficas ou teológicas nos argumentos de mesa de bar.

Por atenção, amizade e o fugaz coleguismo de atividade, que nos levou a estreitar mais ainda nossos laços ideológicos, fui brindado com a preferência para aquisição de Ghost sem que houvessem lances de leilão, comuns em situações de disputas por obras de arte. O quadro acompanha-me desde àquela época e tem uma história não só esboçada na surpresa pelo choque da sua expressão causado na filha do artista como pela sua “sobrevivência” ao incêndio que destruiu minha biblioteca, consumindo uma infinidade de livros raros e o acervo de obras de arte amealhados em mais de 40 anos, entre outras raridades. Sobreviveu Ghost que, por ironia, expressa uma objetividade existencial irrefutável: O viver e o morrer!

O ARTÍSTA

Vanderlei Assis é um desses artistas difíceis de se encontrar nos catálogos comuns dos Marchand, pois ele é especial sem querer sê-lo. Sua generosidade humana, desvestida do ego, do pragmatismo fútil e comercial, do esnobismo e do convencimento ilusório; sua tranquilidade, irradiando paz mesmo em meio a uma guerra; a leveza de sua alma que colhe do nada a semente para frutificar a obra, criando belas ilusões ou afrontando-nos com verdades absolutas, que por vezes fugimos de ver, ou de aceitar, são mostras da sua potencialidade como Artista.

Esse Vanderlei-Artista conheci muito tempo depois de com ele transitar por caminhos eivados de espinhos na estrada política. Nosso trânsito pelas áridas estradas que possibilitam encontros e desencontros, nos debates ideológicos, não me deixaram ver no colega político um Artista com a sensibilidade que ora reconheço. Médico, Físico, Professor e Matemático o Artista Vanderlei se completa na Arte e a Arte o completa. Suas várias obras retratam desde o rosto desconhecido expressando a existência humana, passando pelas fotografias da sua terra, o Rio de Janeiro, onde o mar é a mansidão e a infinitude, até um surréalisme francês cunhado por André Breton com base na ideia de "estado de fantasia supranaturalista" de Guillaume Apollinaire, e que traz um sentido de fuga da realidade comum, transpondo-se para uma supra-realidade. Essa tentativa de resolver uma contradição antiga entre sonho e realidade criando uma realidade absoluta fazem daqueles e dos atuais artistas exploradores, nas artes, do imaginário e dos impulsos ocultos na mente.

Vanderlei seguramente tem do seu público, de seus admiradores e dos seus companheiros de tantas lutas, algumas perdidas, outras vencidas, sem que vencer tenha sido a glória, mas sim a compensação pelo esforço de se querer o melhor para àqueles que habitam este mundo que nos foi dado por emanação, tem, sim, seguramente uma gratidão pela sua generosidade humana expressada por la sympathie de l'artiste.

OBRA: Ghost
TELA: 86 X 63
AUTOR: Vanderlei Assis
ACERVO PARTICULAR do Prof. Irapuan Teixeira

Obra declarada à Receita Federal como patrimônio.