domingo, 29 de março de 2020

UMA REFLEXÃO

Estamos em quarentena; resguardo temporário com o objetivo de proteger nosso corpo de uma alardeada pandemia que se espalha pelo mundo; podendo nos atingir com grande intensidade.

10 dias já se passaram de tal isolamento; a solidão é vizinha do medo e da angustiante espera. O mundo está parado, quase apático, perplexo, contemplando o vazio das ruas e o silêncio das multidões, como se não houvesse uma forma de se defender.

Esse tempo vazio e silencioso convida-nos a pensar e uma pergunta se impõe: Será que cada um de nós está aproveitando este interregno de tempo para refletir com mais profundidade sobre o seu existir e a sua missão existencial?

Por que e para que estamos no mundo? O que temos feito no mundo?

Religiosos ou não este momento é propício para o homem curvar-se à possibilidade metafísica e reconhecer da impossibilidade de estarmos sós no mundo. Albert Camus, um filósofo existencialista ateu curvou-se e reconheceu: “Eu não creio na sua ressurreição, mas não ocultarei a emoção que sinto diante de Cristo e dos seus ensinamentos. Perante Ele e a sua história não experimento senão respeito e reverência”.

Neste momento em que observamos uma possibilidade mortal, que nos ataca de forma invisível, cruel, sorrateira, sem que possamos divisá-la, sem que possamos recobrir-nos com armaduras de aço e nos escondermos do perigo, não seria o exato momento de concluirmos que àquilo que não aparece fisicamente é também real?

Não seria o momento de curvar nossa arrogância e definitivamente aceitarmos que o imaterial é parte integrante do mundo material?

Nossas defesas são agora frágeis perante à um perigo mortal que não divisamos, não podemos tocar com as mãos e afastá-lo de nosso corpo. Se o homem pudesse agora ver seu inimigo e implorar por sua vida certamente o faria; mas esse inimigo é invisível!

Por que temos medo do invisível quando nos ataca perigosamente e o sentimos real? E por que negamos o invisível quando ele se apresenta como um Ser de bondade, de salvação, de amor e de fé?

Não foi assim o pensamento do existencialista ateu Camus quando afirmou: “Não ocultarei a emoção que sinto diante de Cristo e dos seus ensinamentos! Perante Ele e a sua história não experimento senão respeito e reverência”!

E os homens da Igreja? Os homens que dizem ter fé? Os homens que oram, rezam e professam uma religiosidade morna e vazia, apenas para que sejam vistos pelos demais pares como tementes a Deus; mas não passam de fantasmas nas igrejas, de autômatos que por imposição do seu meio social se dizem crentes, mas ao primeiro solavanco nas muralhas de um templo correm a se esconder em outras paredes? E os fiéis que abandonam seu melhor amigo à solidão, esquecendo-se da missão que tinham para com o Criador? Sóis fraco homem! Muito fraco e com uma fé morna e adormecida pelo egoísmo que te empurra aos prazeres de pouca relevância.

Onde está tua reverência, tua emoção quando Cristo nos Ensina? Tua fé está aquém da fé de um ateu?

Meus Deus busca esse homem para tua igreja! Salva esse homem que é também teu filho e faze-o curvar-se à nosso Senhor Jesus Cristo, imagem viva em todas as mentes Cristãs que apesar de mais de 2 mil anos fisicamente separado de nós é presença espiritual que nos conforta e nos faz caminhar por esse mundo que tu, ó Deus, nos colocou para expressarmos nossa existência terrena.

Mais de 2 mil anos se passaram, mas está viva em nossa mente a imagem desse Homem que revolucionou o mundo de ontem até hoje, até amanhã e até sempre! Revolucionou o nosso modo de pensar; desde o passado até o presente. Ele nos apontou o caminho que devemos seguir neste mundo e se N’Ele confiarmos estaremos seguros, pois “A tua palavra é lâmpada que ilumina os meus passos e luz que clareia o meu caminho”. (Salmos 19:105).

Será que nós, homens do tempo moderno, seguimos a Palavra de tal forma que conseguiremos entender e ver essa luminosidade à nossa frente?

Caminharmos em conformidade com os ensinamentos que nos foi outorgado por Jesus Cristo é o primeiro passo para respondermos ao questionamento sobre por que e para que estamos no mundo.

Nossa existência seria absurda se nada estivesse que ser feito em um mundo que ao mesmo tempo que o fazemos, também nos fazemos neste mundo; pois o homem é um ser em trânsito, a cada passo dado é um fazer e um fazer-se!

Fazer o mundo e se fazer no mundo seguindo os ensinamentos do Criador é caminhar firme e com a certeza absoluta de que não iremos tropeçar. Para tanto deveremos ter sempre em mente a necessidade de afastar os pés de todo caminho mau para obedecer à palavra de Deus. (Salmos 119:101)

Estando de braços dados com o Criador teremos a certeza que encontraremos a resposta para nossa situação de ser existente no mundo e a missão neste mundo. Para tanto também deveremos refletir e nos perguntar: O que tenho feito até agora no mundo?

Àquele que tiver dúvidas deve clamar ao Senhor Deus:

“Ensina-me, ó Senhor, o caminho dos teus estatutos, e guardá-lo-ei até o fim.
"Dá-me entendimento, e guardarei a tua lei, e observá-la-ei de todo o meu coração.
"Faze-me andar na vereda dos teus mandamentos, porque nela tenho prazer.
"Inclina o meu coração aos teus testemunhos, e não à cobiça.
"Desvia os meus olhos de contemplarem a vaidade, e vivifica-me no teu caminho.
"Confirma a tua palavra ao teu servo, que é dedicado ao teu temor.
"Desvia de mim o opróbrio que temo, pois os teus juízos são bons.
"Eis que tenho desejado os teus preceitos; vivifica-me na tua justiça” (Salmos 119:33/40)

A Bíblia nos aponta para seguir os passos de Jesus: «Porque para isto sois chamados; pois também Cristo padeceu por nós, deixando-nos o exemplo, para que sigais as suas pisadas. O qual não cometeu pecado, nem na sua boca se achou engano. O qual, quando o injuriavam, não injuriava, e quando padecia não ameaçava, mas entregava-se Àquele que julga justamente; Levando Ele mesmo em seu corpo os nossos pecados sobre o madeiro, para que, mortos para os pecados, pudéssemos viver para a justiça; e pelas suas feridas fostes sarados» (1 Pedro 2,21-24).

Nossa vida terá sentido neste mundo se seguirmos o caminho do Senhor Deus; percorrermos a estrada existencial sabendo porquê estamos aqui e para que estamos aqui! 

Certamente que não estamos sozinhos e isto nos encoraja a caminhar engajados!

Levantemos nossas mãos ao céu e roguemos a Deus que segure nossas vidas!

Compromissamo-nos com a caminhada existencial ao lado de Jesus e certamente a felicidade que encontraremos será inexplicável e para sempre.

Que Deus nos abençoe para que possamos ultrapassar mais um percalço em nosso caminho.


Amem.

sábado, 21 de março de 2020

UM GIRO PELA CIDADE


Já faz algum tempo que deixo meu carro na garagem e caminho pela cidade observando o comportamento humano. Em um domingo desço pela rua de minha morada, uma servidão tranquila e que um dia foi Condomínio de uma única família, e desbravo um cantinho da cidade que escolhi para um tempo. Essa tal ruazinha de que falo, e habito, e que construí meu castelo, é estreita, mas está bem calçada, iluminada com o amarelado tristonho de luzes antigas; algumas portas e janelas próximas a calçada, como em Azenhas do Mar, em Portugal ou Albarracín na Espanha.

Dessas belas recordações de viagem às tristes memórias de certos momentos, a reflexão leva-me à um dia de domingo e relembro que, já passado alguns meses, quando descia pelo mesmo caminho que habituei-me a fazer desde quando resolvi, neste recando, resguardar-me um pouco mais, como a um ermitão, da vida atribulada que tive, deparei-me com um gemido:

-----“Vou morrer!"

-----“Mulher, eu vou morrer?”

Todos iremos morrer..., hoje, amanhã, todos os dias, um dia...

Entristeceu-me àquele lamento de uma pessoa que conheci, mesmo que eventualmente; a voz deixou transparecer não só medo, mas dor e uma certeza escondida na aflição que deve anteceder aos desenlaces humanos.

Toda vez que passo em frente àquela casinha elevo meu pensamento a Deus e faço uma oração por àquela alma.

Os acontecimentos são um turbilhão em meus pensamentos e caminhar pela cidade faz-me pensar sobre cada passo dado, sobre cada espaço em que me extasio ou me entristeço, sobre cada pessoa anônima que vejo.

Aqui e acolá grupos de pessoas sorriem, conversam; alguns cabisbaixos, outros em passos acelerados e àqueles que estão jogando conversa fora e chutando algumas pedras pelos seus caminhos.

Bares; muitos bares, afinal é uma cidade turística e, parece-me, que o único cantinho que sobrou com absoluto silencio é onde volto depois para descansar: O meu castelo, a minha servidão, o meu lar.

Um bar chama minha atenção com mais ou menos 20 pessoas, todos jovens; mais outro bar e mais outro. Estou próximo à universidade e mesmo aos domingos os jovens ali se reúnem.

Um outro recanto de encontros faz meu olhar observar que não somente o calor faz com que as pessoas bebam muito; é o vício, o costume, os encontros entre amigos ou namorados. A bebida é o que permeia todas as mesas e em cada mesa muitas ilusões. São tais ilusões que observo no homem; este ser ereto que equilibra-se em um mundo de exibições. Sozinho, angustia-se; em multidões nunca consegue expressar Alteridade.

Nesse viés seguimos fazendo o mundo e, ao mesmo tempo, nós fazendo no mundo! Uma pergunta, porém, inquieta-me: Que mundo? Que mundo estamos fazendo? Estamos fazendo ou destruindo o mundo já existente?

Enquanto o homem continuar acreditando na sua supremacia e na possibilidade infindável das suas descobertas, sem dar-se conta de reconhecer sua ignorância, finitude e a finitude do próprio mundo, caminhará para antecipar sua própria destruição.

Este homem petulante que se acredita poderoso, empunhando a ciência como um trunfo do seu poderio, nunca observando o que transcende ao mundo e ao seu próprio mundo, morrerá sem saber e sem percorrer o seu infinito.

Observo também que tal poder se desfaz quando tragédias apontam ao homem sua inércia e impotência; então de poderoso torna-se religioso e clama por Deus em orações.

À minha frente uma igreja; sim, em tais andanças também encontro e encontrei muitas igrejas e sem nenhuma curiosidade, como àquelas do tempo de menino, eu perpasso a grande porta de madeira nobre; verniz escuro, torneada com desenhos abstratos em trabalho perfeito do Artífice. Agora não é curiosidade como o menino de um dia; observar tais entalhes é extasiar-se com a arte e reconhecer que a mão do homem quando faz coisas belas tem um aporte divino.

Uma outra arte, a do sermão, ou do discurso, é tarefa de um Padre, quem sabe Dominicano ou seria Jesuíta? Ou Franciscano? A arte de um sermão informa, encanta, orienta e apazigua nossa alma; seja de qual ordem for, o Padre que tem o dom e a arte de falar deixa-nos bastante atentos à seu sermão, quiça como fazia o Padre António Vieira, que hoje se lê com emoção: “Primeiramente, digo que temos hoje nascido de Maria a Cristo, Senhor nosso, não como nasceu há três dias, mas com outro nascimento novo. E que novo nascimento é este? É o nascimento com que nasceu da mesma Mãe daqui a trinta e três anos, não em Belém, senão em Jerusalém. Isto é o que diz o nosso texto, e provo: Maria, de qua natus est Jesus, qui vocatur Christus: Maria da qual nasceu Jesus, que se chama Cristo. - Cristo quer dizer ungido, Jesus quer dizer salvador. E quando foi Cristo salvador, e quando foi ungido? Foi ungido na Encarnação e foi salvador na cruz. Foi ungido na Encarnação quando, unindo Deus a si a humanidade de Cristo, a exaltou sobre todas as criaturas, como diz Davi: Unxit te Deus, Deus tuus, oleo laetitiae, prae consortibus tuis. - E foi salvador na cruz, quando por meio da morte, e pelo preço de seu sangue, salvou o gênero humano, como diz S. Paulo. Factus obediens usque ad mortem, mortem autem crucis. Propter quod et Deus exaltavit illum, et donavit illi nomen, quod est super omne nomen, ut in nomine Jesu omne genu flectatur. - Logo, quando Cristo, Senhor nosso, nasceu em Belém, propriamente nasceu Cristo, mas não nasceu Jesus, nem salvador: nasceu Cristo, porque já estava ungido pela união hipostática com que a Pessoa do Verbo se uniu à humanidade; e não nasceu Jesus nem salvador, porque ainda não tinha remido o mundo, nem o havia de remir e salvar, senão em Jerusalém, daí a trinta e três anos.” (Sermão XIV (1633) - Edição de Referência: Sermões. Vol. V Erechim: EDELBRA, 1998).

Andanças, quem sabe seja este o título adequado para escrever sobre minhas caminhadas que geram reflexões, encontros, sonhos, textos e a certeza, em oposição a Sartre, de que não estamos sós no mundo!

“Eis que estou convosco todos os dias, até o fim dos tempos.” (Mt 28,20)

Continua...