sábado, 24 de novembro de 2012

PROLEGÔMENOS SOBRE ÉTICA




Muitas pessoas utilizam a palavra Ética querendo na verdade referir-se a questão Moral; moral é uma coisa, ética é outra. A ética, em contraposição as questões morais, não muda com o tempo. Se uma coisa é moralmente condenável num período da história, em outro pode não o ser. Isso não acontece com a Ética. Ser ético nos tempos de hoje vai exigir as mesmas condições que o foram no tempo de Sócrates.

Alguns autores convêm citar, para ancorarmos nosso raciocínio: Baruch de Spinoza, o teólogo judeu; Aristóteles, o estagirita grego; Sócrates, o filósofo do discurso interrogativo e que nada escreveu, deixando essa tarefa para seus discípulos, entre os quais Platão, que também abordou com maestria o tema, e tantos outros.

Nossa proposta é abordar algumas questões de ordem ética e não esgotar o tema. Este estudo não é completo, apenas abordagens sucintas, mas nem por isso perde sua importância.

Para ser ético, de modo geral, “inicie mantendo-se como um modelo de civilidade e eficiência; suas mãos não devem se sujar com erros e atos desagradáveis. Procure ser impecável em seu comportamento tendo sempre presente que o outro é você” (1).

Esta citação demonstra de modo radical (radical de raiz) que cada ser humano [i]deve se colocar no lugar do outro, para entender melhor a postura ética. Quando destaca: “o outro é você”, demonstra a necessidade da alteridade entre as pessoas, pois todos são iguais enquanto seres-humanos. A ética, portanto, dirige a ação do indivíduo para o bem; o contrário seria a maldade, e a maldade é resultado da ignorância, diz Sócrates e Platão. Porém, não basta apenas o conhecimento sobre o dever para que sejamos inclinados a cumpri-lo, é necessário, sim, que haja um esforço através de nossa vontade para poder subordinar a conduta ao dever.

É crível que o homem tem um senso moral inato e esse senso moral inato poderia levá-lo a praticar boas ações; mas, por outro lado, não se pode negar que estas boas ações só se estabelecem através do conhecimento de normas do dever que, assim, facilitaria o seu cumprimento.

“A Ciência Moral mostra, com clareza, os princípios que devem orientar nossa conduta e justifica, racionalmente, o dever que devemos cumprir, evitando que nossa ação seja dominada pelas reações instintivas, pelos impulsos da afetividade e pelos sofismas da paixão” (2).

Sócrates, o grande Filósofo Grego que pelo cumprimento das normas Éticas e devoção à sua Cidade, Atenas, preferiu a morte ao invés da possibilidade de fuga para o exílio, deu-nos mostras irrefutáveis da importância de mantermos uma conduta moral irrepreensível, pois isso nos torna, além de homens do bem, um ser que postula pela reta razão. A ciência Ética, que por alguns autores é denominada de a ciência Moral, no contexto segue, entretanto, o mesmo vértice, uma vez que tem suas responsabilidades no encaminhamento moral, sendo um complemento indispensável as demais ciências e, “quem sabe se todas as ciências, sem a ciência do bem, seriam mais nocivas do que úteis” (3).

Sócrates nos ensina que não pode existir no comportamento do homem ação que não seja precedida por uma norma ética e para tal devem existir os valores morais que estabelecem nossa conduta inserida na sociedade. O progresso da inteligência e da cultura seria supérfluo e até prejudicial, se não concorresse para melhorar o homem e encaminhá-lo à prática do bem.

Portanto, Ética, ou moral, como diz o Prof. Theobaldo Miranda, é o estudo da ação humana enquanto livre e pessoal. Sua finalidade é traçar normas à vontade da sua inclinação para o bem.

É bom observar que a conduta ética também exige a liberdade do homem e, entender que não poderia existir liberdade sem pressupor a responsabilidade. Quando falamos em Ética, então, estamos afirmando a liberdade e a responsabilidade humana.

Finalmente, tenhamos presente que três condições se apresentam como necessárias para o exercício da conduta ética: A razão, o livre arbítrio e a inclinação para o bem. A partir de então poderemos especificar funções para o cumprimento de normas éticas, a saber, de modo geral: A Ética no trabalho; a Ética nas questões Ecológicas; a Ética no Direito; Ética e Tecnologia; Ética e Família e assim por diante.

Vejamos um exemplo de texto antigo, belíssimo, em que Sófocles, em Antígona, exalta o homem e o trabalho mesclado com a dimensão ética a que, como norma, o homem cumpre:

Epidauro, anfiteatro grego
“Existem inúmeras coisas maravilhosas na physis. Nenhuma, porém, é tão maravilhosa como o Homem. Singrando os mares bravios, impelido pelos ventos meridianos, ele navega. Arrasta as vagas ingentes que rugem a seu redor. Gê, a suprema divindade que a todas supera desde a eternidade, o homem talha com suas charruas graças à força das mulas, revolvendo e fertilizando o chão, ano após ano.

“A tribo dos pássaros ligeiros, o homem a captura. Ele a domina. As hordas de animais selvagens e de visitantes das águas do mar, o homem prende nas malhas de suas redes. Amanhã, igualmente, tanto o animal do campo... o dócil cavalo... como o touro selvagem das campinas” (4).

Obvio que Sófocles está a se referir ao trabalho, em sua época; o trabalho do homem; o trabalho que dignifica e enobrece; o trabalho que deve ser exercido com retidão.

Quando o homem penetra a natureza e faz dela sua serva colocando-a a seu serviço, desvendando seus segredos e a subjugando, o faz para manter-se vivo e hígido, com vigor para suplantar as adversidades inerentes à vida; entretanto essa dominação da natureza pelo homem só terá valor se a inteligência humana tiver iluminação suficiente para observar que o veio da vida só poderá permanecer existindo conformidade entre o uso ético da natureza e a sua preservação, perpetuando assim a própria existência humana.

Se o homem agir iluminado pela sua inteligência certamente saberá que a profissão exige-lhe saber o significado da sua vocação e a consciência que somos diferentes; que na unidade existe a diversidade, portanto, cada ser labora conforme a sua aptidão. Sejamos fieis a nossa vocação e saibamos que cada homem tem a sua finalidade no mundo e a sua parcela de responsabilidade na sociedade; todos fazem parte de um mosaico que necessita da totalidade da participação, uníssona, para existir.

Assim, sabendo que somos apenas parcelas de um todo, o outro sempre nos será necessário e, esse outro, será tanto o ser humano quanto a natureza. Não poder dispensar essa parte do todo significa que a ação do homem sobre a natureza e a necessidade do outro se estabelecem com regras éticas rígidas e necessárias.

Dar-se conta de que a vocação de cada homem é de suma importância e necessária a todos os demais, faz-nos acreditar no valor do trabalho individual e da importância em gostar de tudo aquilo que se faz; da mesma forma ver e saber que aquilo que o outro faz também é de suma importância para nós; somente assim poderemos co-existir.

A importância de todas as profissões e sua relação com cada um de nós demonstra a necessidade do trabalho de todos, irmanados e direcionados ao bem. Cada homem é de suma importância ao mundo e cada homem é de suma importância para cada um de nós com o seu trabalho e o seu conhecimento. Entender isso significa compreender a necessidade de dar valor ao trabalho de todos e, assim, a dimensão ética estará presente nessa consideração.



[i] (1) Prof. Irapuan Teixeira, in Curso de PG em Direito na FADOM-MG
(2) Prof. Theobaldo Miranda, in Curso de Filosofia no IEEG.
(3) Sócrates (469-399 a.C.) citado por Platão (427-347 a.C.).
(4) Sófocles (496-406 a.C.) em Atígona.

2 comentários:

Aline Goulart disse...

Bela postagem. Gostei da diferenciação entre a moral e a ética. Muitas pessoas confundem esses dois conceitos.
Fiquei muito feliz com a sua visita. Espero que volte sempre. Beijinhos e uma ótima semana.

BIA disse...

Oi Prof. Irapuan!!!

Uma aula sobre Ética, uma disciplina que deveria ser iniciada no jardim da infância, pois uma base estruturada esta diretamente relacionada a formação do caráter, na construção de cidadãos honestos e dignos. Infelizmente muitos desconhecem totalmente o significado desta palavra.
Bjs :)